sábado, 14 de novembro de 2009

Sim sim

A. Maria

Se entregar e viver. Parece que a gente só sabe que podia se jogar depois que o tempo de se jogar passa. E ai esse tempo de curtir o melhor de tudo já se foi.
No começo é fácil curtir. Porque a gente nem pensa na hora seguinte, quanto mais no amanhã.
Mas ai inevitavelmente o amanhã vem e o depois também. E aí? E depois?
E agora como é que a gente faz? (lembra?)
Às vezes tudo parece fácil. Se joga e pronto, camarada.
Sim sim, só que muitas vezes o pronto vem acabado. E aí, como é que eu fico já que ta tudo acabado?
Acabada mais uma experiência que testávamos, como cientistas em seus laboratórios. Só que eles registram tudo e partem para outra, ou para um aperfeiçoamento daquela outra. E nós às vezes não conseguimos registrar nada e choramos, morremos.
Sim sim, somos cientistas, experimentamos a vida, as sensações, as pessoas, os cheiros e os beijos. Só que às vezes o resultado da experiência é tão satisfatório que ficamos como aqueles caras que depois que descobrem um fenômeno massa, ficam o resto de suas vidas falando sobre ele, olhando para ele e refazendo todos os procedimentos ao invés de partir para descobrir o novo.
E esse é o grande perigo. Essa é a armadilha. Esse é o fim.
Não quero ficar olhando, parada, para aquela experiência maravilhosa que me fizeste descobri. Temos que partir para o desconhecido. Mas isso não implica dizer que preciso partir para começar outra experiência. Talvez o que seja preciso, é somente aperfeiçoar o resultado obtido, acrescentar e diminuir, aqui e ali, te dar e te roubar alguma coisa, misturar nossos cheiros e nossas cores, talvez.
Mas sabe o que é? É que o resultado que obtive, ganhou vida e tem vontades. E aí eu não posso mais tirar e botar quando eu quiser, fazer e desfazer como eu quiser. E pra “piorar”, ele sabe o que quer. Sabe tanto que me dá arrepios.
É que eu sou tão cientista que quero sempre controlar tudo e termino achando que o resultado é você. Dizem que é um mal do leonino. Dizem que sou do signo de leão. Mas nem tudo o que dizem está certo. Nem tudo que dizem é a verdade. E eu nem sei se existe mesmo a verdade.
Mas uma coisa é verdade. É verdade nem que seja aqui, através destas palavras.
E essa verdade é que no fim na experiência do meu hoje, descobri que de todo o desejo que eu tenho, metade foi tu que me deu. E aí concluo que você não é o resultado da minha experiência. Concluo que o resultado é o que estamos procurando e que tu estás do meu lado, testando em mim assim como eu em tu.
E mais uma vez, perplexa, doida e delirante, vejo que de todo o desejo que eu tenho, metade foi tu que me deu.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Lambanças

A. Elisa

É chato ter que lembrar de você toda vez que aquela música do Oasis toca, até porque ela toca toda vez na rádio, que eu escuto no caminho para as aulas de inglês, todo sábado. Também detesto ter que lembrar de você todo fim de tarde de sexta-feira, quando você me ligava dizendo, que estava com saudades e querendo sair para comer, aquela pizza, que eu não curto muito, porque a massa é fofa e, principalmente, porque você sempre pede borda de catupiry, que eu detesto. Nisso, já são dois dias da semana que eu penso em você.

Ainda lembro de você, quando passo numa banca de revista e vejo as de Sudoku, que você adorava fazer enquanto eu demorava horas escolhendo uma roupa para sair. Teu rosto me vem na cabeça, quando eu vou naquele bar, que a gente freqüentava e vejo, que alguém pediu aquela bendita caipiroska, que me fez dizer “eu te amo”, na segunda vez que a gente saiu juntos. Lembro do teu rosto, ao mesmo tempo feliz e confuso, lembro também do dia seguinte, quando a gente acordou junto e você me disse, bem baixinho “eu também”, e eu senti, que o mundo podia acabar, porque eu já tinha ali, do meu lado, tudo o que eu queria pra ser feliz.

E assim a semana vai passando, e eu vou encontrando motivos pra lembrar de você todos os dias, por quase todos os minutos e é um saco isso! Eu queria poder ouvir Oasis sem lembrar do teu cheiro. Queria poder sair na sexta com meus amigos e não pensar das vezes que eu voltava pra casa morrendo de fome, porque me recusava a comer da mesma pizza de sempre, e aí você ficava com pena de mim e me comprava um Big Mac.

Quero poder comprar minhas revistas sem lembrar dos teus gostos, quero poder me arrumar sem pensar na cara, que você fazia quando eu trocava de roupa pela quinta vez. Quero dormir sem pensar no teu “eu também”, e quero acordar sem procurar com a minha mão a tua barriga, que eu gostava tanto de acariciar. Quero os dias da minha semana de volta. Quero a minha vida de volta. Quero que você saia dela e arranje outra cabeça para atormentar. Quero me esquecer de você, mas sobretudo, quero que meu corpo te esqueça.

sábado, 31 de outubro de 2009

Para viver um grande amor

V. de Moraes

Para viver um grande amor, preciso é muita concentração e muito siso, muita seriedade e pouco riso - para viver um grande amor.
Para viver um grande amor, mister é ser um homem de uma só mulher; pois ser de muitas, poxa! é de colher... - não tem nenhum valor.
Para viver um grande amor, primeiro é preciso sagrar-se cavalheiro e ser de sua dama por inteiro - seja lá como for. Há que fazer do corpo uma morada onde clausure-se a mulher amada e postar-se de fora com uma espada - para viver um grande amor.
Para viver um grande amor, vos digo, é preciso atenção como o "velho amigo", que porque é só vos quer sempre consigo para iludir o grande amor. É preciso muitíssimo cuidado com quem quer que não esteja apaixonado, pois quem não está, está sempre preparado pra chatear o grande amor.
Para viver um grande amor, na realidade, há que compenetrar-se da verdade de que não existe amor sem fieldade - para viver um grande amor. Pois quem trai seu amor por vanidade é um desconhecedor da liberdade, dessa imensa, indizível liberdade que traz um só amor.
Para viver um grande amor, il faut além de fiel, ser bem conhecedor de arte culinária e de judô - para viver um grande amor.
Para viver um grande amor perfeito, não basta ser apenas bom sujeito; é preciso também ter muito peito - peito de remador. É preciso olhar sempre a bem-amada como a sua primeira namorada e sua viúva também, amortalhada no seu finado amor.
É muito necessário ter em vista um crédito de rosas no florista - muito mais, muito mais que na modista! - para aprazer ao grande amor. Pois do que o grande amor quer saber mesmo, é de amor, é de amor, de amor a esmo; depois, um tutuzinho com torresmo conta ponto a favor...
Conta ponto saber fazer coisinhas: ovos mexidos, camarões, sopinhas, molhos, strogonoffs - comidinhas para depois do amor. E o que há de melhor que ir pra cozinha e preparar com amor uma galinha com uma rica, e gostosa, farofinha, para o seu grande amor?
Para viver um grande amor é muito, muito importante viver sempre junto e até ser, se possível, um só defunto - pra não morrer de dor. É preciso um cuidado permanente não só com o corpo mas também com a mente, pois qualquer "baixo" seu, a amada sente - e esfria um pouco o amor. Há que ser bem cortês sem cortesia; doce e conciliador sem covardia; saber ganhar dinheiro com poesia - para viver um grande amor.
É preciso saber tomar uísque (com o mau bebedor nunca se arrisque!) e ser impermeável ao diz-que-diz-que - que não quer nada com o amor.
Mas tudo isso não adianta nada, se nesta selva escura e desvairada não se souber achar a bem-amada - para viver um grande amor.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Dia desses...

A. Elisa

Dia desses não tive sono, e nessa angústia de não conseguir dormir, me revirando de um lado pro outro, procurando me encaixar na cama, me peguei pensando em como a gente se encaixava bem. Era quase que automático, a gente dormindo, um ia se chegando pro outro e ficávamos assim até amanhecer. Você acordava sempre antes de mim e ficava me olhando, ali, enrolada com o lençol até o pescoço, porque você insistia em deixar o ar condicionado bem gelado, e também porque você não me deixava cobrir com uma manta. Talvez fosse por isso, que a gente dormia sempre bem juntinho. Depois que eu acordava e reclamava, pela milésima vez, que eu não queria que você ficasse me olhando dormindo, a gente tomava banho e eu assistia Pequenas Empresas/Grandes Negócios com você, só porque sabia que se eu dissesse, que não gostava do programa, você mudava de canal. E assim a gente ia passando o dia todo na cama, sem ver as horas passarem, levantando de vez em quando pra comer alguma coisa ou ir no banheiro. Me peguei pensando nisso e também no porquê da gente ter deixado de fazer tudo isso. No porquê de a gente agora dormir separado, no porque de eu estar nessa cama vazia sem conseguir dormir, sentindo falta do nosso encaixe. A distância faz a gente perceber que aquelas menores coisas são as que sentimos mais falta, como quando você botava leite no meu café, mesmo sabendo que eu só gosto de café puro; como você sempre aparecia com um filme romântico pra gente assistir, quando sabia que eu estava com TPM; ou como no dia que eu soube que tinha passado no mestrado, e que por conta disso ia morar na Espanha por dois anos, e você viu o nosso final eminente, e me disse “você mereceu!”.
Aqui, esses dois anos custam a passar, e o sono custa a chegar. Mas aí, agora que eu lembrei dessas tuas palavras, me lembrei que eu decidi isso, sabe? Que eu procurei isso e, que você esteve comigo durante todo o processo e que você me disse que sabia, que o nosso futuro era certo e tudo estava guardado, que se não fosse agora, ou daqui a dois anos, um dia a gente ia se encaixar naquela cama de novo. E então começou me dar uma tranqüilidade, um sono, um sono imenso e sem nem ao menos ter que te ligar, dessa vez, só de lembrar das tuas certezas eu continuei de pé para mais um dia de estudo.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Vamos entrar.

A. Maria

Me dê uma noite e um pouco da manhã, só preu sacar se os olhos mudam de cor.
Só pra eu saber se eu sou só eu, ou já deixei de ser.
Pra saber se são eles ou as cores que mudam.
Se eu já deixei de ser ou misturei.
Onde será que toda aquela coragem, confiança e força se esconde quando eu me pego assim como agora?
Cá estou eu mais uma vez jogando letras na tela pra ver se elas me ajudam a descobrir, já que aqui na minha caixola elas não estão colaborando muito.
É, acho que o homem não esta adaptado a mudanças. E quando ela vem, parece que tiraram o chão dos seus pés.
Ele também não sabe perder. Não se conforma em ter que perder.
Será mesmo que é o homem? Ou a mulher? Eu?!
Parece que junto com o sangue que perco todo mês, de tempos em tempos, como um filho que nasce, sabe? É, parece que de nove em nove meses, em média, junto com esse sangue perco mais uma porrada de coisas.
Esse mês parece que foi o escolhido.
E a cada dia tenho mais certeza que perdi uma flor, minha flor, e eu também era flor dela.
É, isso foi ruim.
Perdi também toda aquela confiança em mim, sabe? Aquela que me fazia crer que podia tudo. Aquela que vinha junto com minha coragem e certeza.
Mas isso não sei se foi de todo ruim, já que talvez isso me tenha feito encontrar outra coisa que como ainda é talvez, prefiro ficar procurando a certeza.
Perdi também a paciência de esperar o telefone tocar, de esperar o fim de semana pra tomar cerveja e de esperar a digestão se completar pra comer mais chocolate.
Mas aí também não creio na coisa como ruim.
Perdi meu brinco de bolinha e meu cheiro de independência.
Parece que quando perco uma coisa, saio perdendo tantas outras.
Perco a hora do cinema, a hora do banco e a hora de parar.
Parar. Parar.
Quando essa enchurrada que me leva tantas coisas, junto com o sangue vermelho escuro, vai enfim sossegar e deixar que o sol seque minhas roupas, meus cabelos e minha pele. E aí me deixar procurar e encontrar de volta tudo que perdi.
Quando será que eu vou poder ter a certeza de que na verdade me encontrei.
Que na verdade...
Achei.

domingo, 18 de outubro de 2009

Aqui dentro

A. Elisa

E aquela minha pequena parte, que fica atrás do meu peito, começou a bater de novo e não tem cristão que a sossegue. É um bate-bate que não me deixa dormir, que não consigo me concentrar, escrever, não sou eu. Essa fúria, essa vontade de viver, fazia tempo que eu não sentia e, principalmente, fazia tempo que eu não me deixava sentir. Não sei como foi, nem sei dizer o exato momento que minhas veias começaram a saltar, minhas mãos a suar e o meu pensamento a não mudar de assunto. Também nem quero pensar como começou, o que deu em mim de me arriscar assim, violentamente, num precipício que nem o fundo eu vejo. Me joguei como fazia tempo que eu não me permitia. E aí eu comecei a pensar que eu deveria começar a me jogar em mais coisas na minha vida, curtindo somente os resultados bons e minimizando os ruins. Porque a razão pra esse meu peito não sossegar, ultimamente, foi simplesmente o fato de não ter criado expectativas, de ter ido a favor da maré, e de vez em quando, contra o vento. E, apesar das borboletas terem parado de bater na minha barriga, parece agora que elas voaram pro meu coração, sim, essa parte de mim, detrás do meu peito, que decidiu, que não vai me deixar curtir três dias com meu irmão e minha prima em Porto de Galinhas, que decidiu que de agora em diante vai bater acelerado todo dia, que decidiu que não vai sossegar, porque não quer que eu volte a viver aquela minha mesmice de sempre, esperando por coisas que nunca viriam. E de tanto esse meu coração decidir fazer as coisas por mim, eu acabei decidindo, que de agora em diante só ele pode fazer esse tipo de escolha por aqui.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Sono

A. Maria

É tudo preguiça.
Medo também.
Ok, é tudo medo e preguiça.
Medo de mais um fim. Afinal todos sabem que ainda não aprendi a lidar com fins.
Preguiça de tomar banho frio, trocar de roupa, arrumar a cama e rezar.
Medo de não dar mais tempo de voltar atrás, de ter falado demais. É que nem todo mundo sabe que pra cair no abismo eu não me importo em ter que impulsionar meu próprio corpo ao invés de esperar o velho empurrãozinho.
Preguiça de ter que esperar.
Medo de cair e ter que precisar escalar tudo de novo por não encontrar minha casa lá embaixo. E ter de subir, reconstruir a velha cabana, (esta que ainda moro) e ficar nela até visualizar outro ponto pra me jogar.
Preguiça de escovar os dentes.
Medo de nem me jogar, e simplesmente acordar covarde amanhã, e ficar esperando que alguém me jogue, ou que você me puxe.
Preguiça de deixar começar mais um dia de gente grande.
Os meus, bem sabem que não seguro nem recuso os comandos dessa coisa que carrego atrás de meu peito. Mas é que às vezes não basta que só eles saibam. Às vezes queria poder estampar isso nos outdoors da cidade, do mundo. Mas mesmo sabendo que se quiser mesmo posso fazer, sei que não vou conseguir atingir o que quero, porque palavras, minhas palavras, são só tentativas.
Palavras são somente tentativas. São somente meios que uso muitas vezes para tirar de mim um pouco do tanto que carrego aqui dentro. É que às vezes fica tão apertado que aperta meu coração e aí sinto o que acho que chamam de angústia. É, acho que chamam porque com freqüência percebo que as palavras que as pessoas dão as coisas tem significados absurdos diante do que essas coisas significam.
É, escrever para mim é como procurar a chave que dá pra estrela no Super Mário. E acabei de encontrar a do estágio chamado hoje.
As palavras que eu uso vêm sempre carregadas de significados errados. Errados para você, já que pra mim significa o que eu quero que signifique. Mas o fato é que descobri que quando me sinto como dizem, angustiada, é que tem muita coisa querendo sair, mas eu ainda não descobri como botar pra fora. E quando isso acontece (boto pra fora), passa. Claro que às vezes demora, mas quando encontro ouvidos dispostos, é rapidinho.
Pronto. O sono veio e botou a preguiça pra fora. Na verdade acho que consegui botar tudo pra fora e agora nem tenho mais medo de nada. Nem preguiça.Aí o sono virou o dono do pedaço.
É que quando to com sono, perco o controle do que falo (ou escrevo). Mas aí fico vazia e o sono toma conta.
Ah, tenho só um pouco de medo. Mas esse medo é meu companheiro de sempre, tipo aquele bicho que o meu Zé acha que mora no armário.
É, agora eu só tenho medo.
E sono.
Ah, mas é um medo bobo.
Medo que vou sentir quando acordar.
Medo porque hoje descobri que não adianta tentar fingir ou querer o contrário. Nem tanto descobri, talvez só aceitei. Que para essa Ana Maria que carrego aqui em mim, nada, nada é casual, tudo deve ser intenso. E verdadeiro.